segunda-feira, 19 de outubro de 2009

... kommunikálni a magyar!

A língua húngara não despreza as suas profundas raízes nos Montes Urais, manifestando, assim, à semelhança daquilo que ocorre com línguas suas parentes (afastadas apesar da raíz comum), como sejam o finlandês ou o estónio, vocabulário e estrutura muito (mesmo muito) diferentes das restantes línguas europeias. "Nagyon köszönöm" e "a sör jó", respectivamente "muito obrigado" e "a cerveja é boa", eram das pouquíssimas coisas que eu sabia dizer na língua magyar. Desde cedo aprendemos que a eficácia da comunicação verbal implica a existência de (pelo menos) um emissor e um receptor e a partilha de um código básico que, na sua essência, configura uma língua. Sem me atrever a pôr em causa a sabedoria de tais ensinamentos, atrevo-me a questionar o status de condição sine qua non da comunicação verbal que é atribuido à partilha de um código linguístico comum. Contextualizemos...
Os cerca de 180 km que separam Hegyeshalom de Budapeste estavam a ser percorridos vagarosamente pelo comboio da MAV (Magyar Államvasutak, a CP lá do sítio). No meu compartimento, um grupo de idosos húngaros partilhavam comigo algum tédio, tédio que não terá sido alheio ao pontapé de saída para a conversa dado por um dos húngaros. Pretexto? O grande 'sol' de protesto contra a energia nuclear cosido na minha mochila: Atomkraft, nein danke!. "Deustchland?", perguntou, decerto muito mais influenciado pela língua dos escritos do tal 'sol' do que pelas minhas características físicas. "Nein, Portugal!", respondi. Foi este o inesperado mote para uma conversa que durou tanto ou mais do que as pilhas Duracell. Na ausência de partilha do tal código sofisticado, a comunicação encontrou sustento no prosaico mundo do futebol.

-Eusébio!
- Puskas!
- Coluna!
- Béla Guttmann!
- Benfica!
- Ujpest Dozsa!
- Vasas!
- FC Porto!
... etc., etc..

Ofereceram-me uma cerveja. Lá brilhei com o "Nagyon köszönöm" e o "a sör jó"...
Mais recentemente, numa viagem à China, o poder comunicacional do futebol esteve mais uma vez em evidência. Um aluno de arquitectura da Universidade de Shanghai, no seu peculiar inglês, perguntou-me:
- De que país vens?
- Portugal.
- ??????.
- Portugal.
-???????.
Desenhei um mapa da Europa num pedaço de toalha de mesa. De Este para Oeste fui apontando a França, a Espanha e, finalmente, o nosso cantinho à beira-mar plantado.
- Ehhhhhhh!!! Figo! Figo! Figo! "Pú táo yá"! "Pú táo yá"!

domingo, 18 de outubro de 2009

Lambidelas em flashback...

Não é novidade para ninguém que as viagens de avião já não são o que eram. A massificação, a competição entre companhias, as ditas 'low-cost' (a curto prazo uma 'maravilha' da mão invisível do mercado, a médio, longo prazo, o 'carrasco' da aviação civil), transformaram uma viagem de avião em algo parecido com o acto de 'apanhar a carreira'. Cabe neste contexto a recorrente busca pelo bilhete mais barato, busca que pode implicar o itinerário mais inesperado, as 'aventuras' aeroportuárias mais inusitadas, ou a antítese daquilo que se espera de uma viagem, de avião... a rapidez. Na semana que passou, recolhi evidência empirica que sugerem a existência de outras implicações...
Tendo como destino final a cidade finlandesa de Tampere, a 'melhor solução' levou-me de Lisboa a Hamburgo, de Hamburgo a Helsínquia e de Helsínquia a Tampere (o regresso ditou um Tampere-Helsínquia-Estocolmo-Lisboa). Em Hamburgo, cinco horas separavam o horário de chegada do Airbus 319 da TAP da partida do Embraer 190 da Finnair. Apesar de gostar de aeroportos e de não me importar muito de passar umas horas a apreciar o peculiar ambiente que os caracteriza, apanhei o Strassenbahn e em 25 minutos estava no centro de Hamburgo. Há 30 anos que não visitava aquela que foi uma das principais cidades da Liga Hanseática. Fi-lo quando (curiosamente) também almejava alcançar as terras nórdicas da Finlândia. Saí na Hauptbahnhof (a estação central), deambulei pela Kirchenallee, percorri as margens do Aussenalster, o grande lago, e os caminhos que, por baixo da Ponte Kennedy, levam ao Binnenalster, o pequeno lago, a praça da Câmara Municipal... um dejá vu com três décadas.
De volta à Hauptbahnhof para apanhar o S-Bahn com destino ao aeroporto, um momento para olhar para a enorme gare e os enormes gleis (cais), com particular incidência para o nº 6: em Agosto de 1979, aquela plataforma serviu-me de 'hotel'; foi naquela plataforma que fui acordado pelas lambidelas de um enorme cão da polícia ferroviária alemã; foi também ali que estive cerca de duas horas a falar italiano com um backpacker (eu pensei que ele era italiano e vice-versa) que vim a descobrir viver em Esgueira e ser estudante na Universidade de Coimbra, aliás como eu, na altura.